O POVO, dezembro de 2002

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O POVO – O ex-voto exposto na capa do livro e na foto ao lado revela a intenção do jornalista Flávio Paiva em Mobilização Social no Ceará (…) mostrar o esforço realizado pela sociedade civil em busca da sua emancipação. Meio papel cumprido, meio papel por cumprir. (…) O jornalista cita movimentos sociais mobilizadores, que tentaram – e tentam – buscar um modelo de mediação entre Estado, sociedade e mercado.

Flávio Paiva – Esse livro é um ex-voto que estou chamando de ensaio-reportagem. Sua intenção primordial é levantar o nosso espírito de cidadania (…) O Ceará é um Estado que só tem 200 anos de formação da sua estrutura política independente de Pernambuco. E, durante essa história recentíssima, o que o Ceará já produziu é impressionante. E não percebemos isso (…) A atitude da negação é uma atitude de coragem e de fé. O ´não´ é uma coisa difícil de dizer. Já é uma afirmação

O POVO – Você permeia todo o livro com essa questão do diálogo e apresenta a sociedade como uma força política muito forte, com uma vontade muito grande de ser ouvida (…)

Flávio Paiva – Temos uma sociedade civil criada pelo Estado. Esse é um problema brasileiro. A sociedade brasileira desembarcou numa caravela. Houve todo um processo de colonização, no qual o Estado é colocado como dono da sociedade (…)

O POVO – No governo Tasso houve as tentativas dos conselhos, que acabaram fracassando. Mas o modelo seria esse, de conselhos setoriais?

Flávio Paiva – O problema desses conselhos é a institucionalização e a manipulação da participação (…) Fortalecer a participação da sociedade civil é bom para todo mundo, para o Estado, para o mercado e para a própria sociedade, além de criar as condições para o rompimento de uma das nossas maiores anomalias que é a perpetuação das sesmarias (…) Para mim, o maior aprendizado nesses 16 anos de reação da sociedade civil diante de um governo autoritário foi perceber que existe um ambiente em que se pode se preocupar em gerir o que é o ponto comum entre esses três pilares da formação da vida social (…) Nós, sociedade civil, precisamos compreender que somos fortes, somos cidadãos capazes de influenciar determinadas decisões, e os nossos políticos mais qualificados precisam compreender que já contam com a sociedade civil (…) Neste aspecto, levantei algumas teses, que não são novas. Uma delas: a sociedade civil pode ser uma categoria política. Outra tese: enquanto a gente se observar pelo olho do colonizador não nos desenvolveremos. E uma terceira tese é a de que só criaremos o Estado desejado e o mercado desejado se tivermos uma sociedade civil forte (…)

O POVO – É preciso também aprender a fazer oposição (…)
Flávio Paiva – Por isso a sociedade civil precisa ser categorizada. Ela tem a flexibilidade que o partido político de oposição às vezes não pode ter (…) uma sociedade civil forte pode ser tolerante porque não está disputando o poder (…) A sociedade civil não disputa o poder, a mobilização da sociedade não é por cargos é pela influência do que ela acredita enquanto coletivo.