Gláucia Magazin – Variedades, Ano VIII – nº 15 – maio/98
TERRA DO NUNCA
Flávio Paiva e a lamparina que criou como símbolo do CD Terra do Nunca.
FAC-SÍMILE |
Com sua linguagem lítero-musical contemporâneo CD Terra do Nunca esbanja sintonia com o que há de mais criativo e atual na música de referência do planeta. Em recente entrevista para o humorista João Neto (Zé Modesto), a cantora revelação da novíssima música pop no Ceará, Karine Alexandrino, revela que vê no trabalho musical de Flávio Paiva, a grande novidade da cena fortalezense. O disco traz parcerias antenadas, como em “Estromboscópica”, feita com Kátia Freitas, e em “Pessoas”, dividida com Mona Gadelha. Para quem não sabe, as duas compositoras e cantoras cearenses estão na seleção disputadíssima que o CD “A Gema do Novo”, em fase de lançamento pela Rádio Musical FM de São Paulo.
O videoclip da música “Xote para Sêneca” (Flávio Paiva), que faz uma analogia entre o discurso do filósofohispânico/romano e a maneira espirituosamente leve de ser do cearense está em fase de filmagem. O roteiro de Otávio e Karla Holanda foi um dos cinco premiados pelo Instituto Dragão do Mar de Arte e Cultura. “O xote é movimento/ fluindo sem parar/ uma sabedoria que sacode o Ceará”. Diz a letra do technoxote, interpretado por Anna Torres e pelo rap-reagger Rica Caveman, da banda Nômade, com arranjo impecável do baixista Paulo Lepetit.
Em “Terra do Nunca” a coerência estética, a unidade e riqueza de multiplicidade é visível e audível a todo instante. É um disco farto de criatividade e olhar inteligente, em sua autêntica expressão migrante. Tem o que dizer sobre mundo, é bom de ouvir e de dançar. Não está preso a clichês convencionais nem alternativos. Nada de narcisismos, dandismos ou esteticismos. A capa do disco é uma cena de elevador, onde as pessoas costumam ficar incomodadas com a presença de estranhos que se encontram cotidianamente. Flávio Paiva, Anna Torres e Paulo Lepetit, num clic certeiro da fotógrafa Cláudia Guimarães, mais do que autores, apresentam-se como atores, como personagens de uma das faixas produzidas em parceria com o bluesman paulista Edvaldo Santana.
Ao escutar Terra do Nunca, percebe-se um obra que colabora para retocar o ritmo e os timbres da MPB, com uma proposta esquisitamente bonita, cheia de requintes experimentais surpreendentemente agradáveis. Para Flávio Paiva a idéia é jogar uma luz reconvexa de forma natural e desarmada para as pessoas que estão dispostas a perceberem que é possível sair da mesmice que vem atrofiando a nossa inteligência. Com base nessa postura insurgente do autor de Terra do Nunca, o professor Wander Frota escreveu um artigo na imprensa local, dizendo que a lamparina criada por Flávio Paiva como arquétipo condutor da sua proposta musical se assemelha, e muito, àquela que carregava em pleno dia de Sol um certo filósofo grego na sua busca por algo mais real.