O uso da música e da poesia na educação vem de longe. Nas sociedades primitivas e nas antigas civilizações os sons e seus significados tiveram papeis essenciais na evolução de muitos povos. Os gregos destacaram-se pela consciência que tiveram desses recursos para o refino das pessoas na formação cidadã. Os monges cuidaram desse assunto na Idade Média e, na Renascença, a pedagogia sensorial deu grandes contribuições ao Iluminismo.
Os sistemas educativos modernos foram aprimorados com a ampliação do conhecimento em áreas como a pedagogia, a psicologia e a neurociência. A compreensão das buscas, interesses, preferências, desejos, necessidades e condutas da criança seguiu um processo gradual de aperfeiçoamento no último século.
Na atualidade, um dos grandes desafios da arte de educar com música e poesia é reduzir a contradição criada entre, de um lado, as possibilidades advindas com a tecnologia digital e em rede, e do outro, a abundante oferta de produções feitas e apresentadas de qualquer jeito, desde que mexam com as crianças.
Por serem vibrantes e por amarem o movimento, as crianças submetidas apenas a aulas e recreações eletrizantes podem até ser facilmente controladas, mas acabam tendo o ouvido e o ouvir agredidos, em uma desmedida redução de sensibilidade no plano contemplativo e tranquilizador, como efeito do excesso de estimulação.
A fragilidade emocional e cognoscitiva, tão presente nos dias de hoje, é, em parte, falta de experiência estética com oportunidade de percepção. Meninas e meninos precisam de momentos para o aconchego das melodias e das palavras, e para as associações que surgem do ouvir, realçando laços comuns das suas vidas cotidianas e ancestralidades.
O mundo tem o sentido que damos a ele. Uno-me aos que acreditam na necessidade das relações imaginativas e da reciprocidade entre sentimentos e pensamentos no cultivo da mente, do espírito, do corpo e do outro. Com o livro-CD Afeto (Cortez Editora), que lançarei em outubro, proponho uma pausa na onda de hiper estímulos, na esperança de contribuir com um pouco de tranquilidade ao mundo infantil.
Em situação normal, toda criança é poética, musical e merece deixar-se fluir no poder transformador da delicadeza e da fabulação. O educador carioca Gabriel Perissé, em seu Estética & Educação (Autêntica, Belo Horizonte, 2009), diz que “não se pode mentir em poesia porque tudo o que se inventa, esteticamente falando, é verdade” (p.87). Eis a chave da alfabetização estética para a escola que se coloca como lugar de encontros.
Despertar nas crianças o prazer da experiência auditiva, a apreciação da beleza do escutar, os valores substanciais das respostas sensitivas e as sonoridades dos instrumentos musicais e das vozes que tocam carinho no ouvido interno imaginativo, gera os estados de ânimo próprios de uma educação com deleite e abertura para uma vida de confluências e equilíbrio.
Mais do que um espaço onde as crianças brincam, se divertem, estudam e desenvolvem o valor da curiosidade, das descobertas, da memória rítmica e analítica e da criatividade, a escola é um lugar de acolhimento, de intercâmbio de possibilidades, de influxo mútuo, de pertencimento, relação e afeto.