Há meio século ele vem se dedicando à causa do livro e da leitura. Nos últimos 40 anos, à frente da editora que leva o seu nome, Cortez destacou-se no Brasil como editor de títulos indispensáveis à educação e às ciências humanas. Mais de 1.300 obras de autores nacionais e estrangeiros estão nesse percurso, incluindo os livros infanto-juvenis. A condução da editora foi passada às filhas e, mesmo indo ao escritório diariamente, ele saiu inventando modos e meios de manter e ampliar vínculos no mundo do saber e do conhecimento.
Chegou a pandemia do coronavírus e, aos 83 anos, Cortez entrou em situação de confinamento. Mesmo achando a palavra ‘comorbidades’ horrorosa, encarou o “Fique em Casa” como uma necessidade pessoal, mas também como uma forma de cooperação coletiva para evitar a expansão da Covid-19. Exercitando a paciência, passou a sair de casa apenas para consultas médicas e sessões de quimioterapia no enfrentamento de um câncer com o qual luta há anos.
A primeira sensação que teve ao se isolar foi a mesma de um castigo que recebeu na infância quando, em um esforço para se mostrar útil e se incluir em conversa de gente grande, revelou às visitas que os talheres de casa eram emprestados. Levou cocorotes, engoliu o choro e ficou isolado por algum tempo. Depois lembrou-se do filósofo espanhol José Ortega y Gasset, que tem obra no Brasil editada pela Cortez: “Eu sou eu e minha circunstância”. E José Xavier Cortez decidiu procurar entender a si mesmo no meio da pandemia.
A quarentena levou à suspensão aulas presenciais de espanhol e o curso da Universidade Aberta à Maturidade (UAM), oferecido pela PUC-SP, onde José Xavier e uma turma amiga busca aprender pela curiosidade de saber mais. Para completar foi interrompido o forró pé de serra do Restaurante Andrade, onde semanalmente ele gosta de dançar miudinho.
Entraram também em modo de suspensão as Rodas de Conversa que ele fazia nas escolas, contando sua história e falando da crença no livro como instrumento de emancipação social. Nesses encontros ele diz aos estudantes com brilho nos olhos: “A leitura me levou a ser o que sou”. Uma motivação bem própria de quem, independentemente das condições encontradas, sempre caminha “cheio de vida, de projetos e de responsabilidades”. Assim, aproveitou a reclusão para escrever e manter a mente ativa.
Com o apoio da jornalista Goimar Dantas, escreveu o livro “Tempos de isolamento” (Cortez, 2020), falando e refletindo sobre o que considera ter de mais positivo: “a vontade de aprender e de viver intensamente”. Foi assim que o editor Cortez entregou o novo desafio a si mesmo, na pessoa de José Xavier, resultando em uma obra pessoal, intimista e aberta a todas e todos que veem nas palavras “laços capazes de nos unir” e na leitura um campo de construção da “capacidade de debate”.
Reacendendo memórias e pensando sobre o presente, Cortez, sendo José Xavier, sai da infância no Sítio Santa Rita, em Currais Novos (RN), quando “cultivava a terra que produzia alimentos, que nutria nosso corpo”, e chega a São Paulo, onde aprendeu a produzir “livros que alimentam nossas mentes, nossas almas”, onde tem uma escola estadual com o seu nome, onde foi reconhecido com o título de cidadão e onde mais recentemente passou a morar em apartamento, experimentando “um pouco a vida dos pássaros em suas gaiolas”, transformando tudo em agradáveis crônicas da quarentena.