Todo final de tarde, quando o sol começava a esfriar, ele preparava a praça para receber as convidadas. De dentro da banca de revistas, onde passava parte do dia, o Sr. Erivaldo tirava cadeiras de pvc empilhadas ao lado do balcão e as colocava junto ao banco de madeira e ferro existente naquele espaço de encontros afetuosos.
Uma a uma, elas iam chegando, sozinhas ou com acompanhantes, e se acomodavam nos lugares em que gostavam de se sentar, formando um grupo de senhoras predominantemente oitentonas autodenominado As Meninas da Praça. Naquela vivência de rua, a conversa solta se estendia até o anoitecer, enquanto carros, bicicletas e pedestres seguiam a dinâmica urbana.
Os encontros na Banca da Praça haviam cessado com a chegada da pandemia de covid-19 em março de 2020, mas foram ameaçados de não mais voltar com o falecimento do Sr. Erivaldo em abril daquele ano. Aos 63 anos, o cicerone daqueles momentos de descontração e amizade fez a viagem de volta, deixando muitas saudades.
Nascido na localidade de Capim de Roça, distrito de Pindoretama, a 60 km de Fortaleza, pelo litoral leste, ele tinha a simplicidade, o carisma e a grandeza humana das pessoas boas do interior. Sempre gentil, fez do seu tempo de aposentadoria uma dádiva em favor de vínculos sociais catalisados em torno da banca da praça João Dummar.
Havia entre As Meninas da Praça uma certa apreensão sobre o destino da banca de revistas. Até que em dezembro passado elas foram convidadas pela família do Sr. Erivaldo para participar de uma homenagem natalina às pessoas que partiram em meio à pandemia. O reencontro teve comidinhas e contou com a música do Jonatas e da Valéria, filho e nora do Sr. Erivaldo.
As Meninas da Praça estavam lá, entre elas a minha mãe Socorro e a minha tia Nilda. O difícil ano de 2021 foi encerrado com a novidade de que a Dona Erineide, viúva do Sr. Erivaldo, passará a tocar a banca, o que significa que as tardes na praça voltarão a funcionar como espaço de prolongamento de comportamento social afetivo, com suas memórias e histórias.
No ambiente da Banca da Praça, as pessoas marcam presença sem necessidade de demonstração de alinhamentos morais, religiosos ou políticos. Naquela roda de mensagens múltiplas, ninguém precisa concordar ou discordar. Cada uma e todas expressam o que querem expressar, falando, gesticulando ou simplesmente ficando em silêncio.
Há um estado de ânimo gerado naquele recanto que propicia alegrias, surpresas, condolências e novidades trazidas de qualquer época. São muitos repertórios de origens distintas e espelhos semelhantes, reunidos em um só espaço de recordações, olhares sobre o presente e perspectivas do funcionamento do mundo.
O conforto do desarmamento psicológico, da não hierarquia de saberes e da ausência de pressão seletiva são segredos que fazem com que As Meninas da Praça gostem de estar juntas ali simplesmente por se sentirem bem. De agora em diante, passam a fazer isso também em memória do sempre querido Sr. Erivaldo.