Copa do Mundo 2014 – O Brasil na marca do pênalti
Artigo publicado na RIVISTA do MINO nº 148 (Editora Riso), p. 20
Edição de julho de 2014 – Fortaleza, Ceará, Brasil
FAC-SÍMILE
Imaginando que o governo tiraria proveito eleitoral da realização da Copa do Mundo no Brasil, os grupos tradicionais de poder no Brasil desencadearam uma campanha fraticida de difamação do país. Esqueceram, como sempre esquecem, que ir contra valores culturais sedimentados, como o futebol, é um risco muito grande. Tentaram de tudo para vulnerabilizar o país, desde a supervalorização de atos de violência até resultados de pesquisas apontando a nossa grave e generalizada situação de insegurança.
Nesse esforço de associar tudo ao que seriam os males da copa, até imagem isolada de policial flechado por índio na capital federal ganhou destaque. A intenção de secar o evento não teve limites. Queriam que os torcedores e turistas pensassem que se viessem ao Brasil acabariam morrendo no que seria uma barbárie brasileira. O tom de ameaça estava sempre vinculado à hipótese de que não estávamos preparados para receber um evento de massas, como se nunca tivéssemos recebido turistas no Carnaval ou nas festas de boi de Parintins.
Fizeram o que seus decadentes poderes de formação de opinião ainda deram para fazer. Mas quebraram a cara. O Brasil pintou-se de verde e amarelo e foi fazendo a festa. Desesperados, os detratores da imagem do país, na vã ilusão de com isso tirar proveito próprio, tiveram que mudar o discurso. Começaram a valorizar a Copa, mas com o cuidado insistente de dizer que o futebol não tem nada a ver com o governo, como se tudo estivesse acontecendo por ordem e graça do acaso.
Na tentativa de descolar do governo o inevitável sucesso da Copa, no dia da abertura uma claque de “yellow blocks”, que é como passaram a ser chamados os neófitos frequentadores de estádio, em alusão os “black blocks” das manifestações de rua, puxou um grito de xingamento à presidenta Dilma Rousseff, que estava no Maracanã, acompanhada da filha Paula. Foi constrangedor. Eles conseguiram que mais de um bilhão de pessoas de todo o mundo vissem o que poderia parecer um desagravo público à maior autoridade do país. Mas o tiro saiu pela culatra e as manifestações espontâneas de solidariedade acabaram fortalecendo a chefe do Executivo nacional.
O perfil médio dos torcedores que vieram para a Copa é bem diferente do perfil dos turistas atraídos ao Brasil por estereótipos do turismo sexual. Alegres e muitos deles em família, esses visitantes foram recebidos de braços abertos pela maioria dos brasileiros. Viram, claro, que não somos perfeitos, até porque não existe sociedade perfeita em qualquer lugar do mundo. Entretanto, aqueles que estavam querendo encontrar cabelo em ovo, chifre em cabeça de cavalo, partiram para outros artifícios. Um exemplo típico desse triste comportamento é a reportagem “Apesar de ações policiais, prostituição cresce disfarçada em Fortaleza” (Folha de São Paulo, seção Poder, 18/06/2014), com a qual o jornal paulistano tenta confundir o êxito da alegria com a Copa na capital cearense com o velho estigma da prostituição.
O “enviado especial” vai ao entorno do estádio Castelão e arranca supostas declarações de travestis sobre o aumento do movimento de gringos em busca de sexo. Não contente, vai também à Praia de Iracema, “ponto preferencial para programas de luxo”. Decepcionado por não conseguir flagrar meninas se prostituindo, conversa com umas mulheres que teriam dito ganhar mais em uma noite de sexo do que trabalhando um mês como balconista. E deduz: “Elas já são maiores, mas começaram desde cedo”.
Não conseguindo fotos extravagantes das cenas que procuravam, a reportagem vai a uma tradicional zona de prostituição no centro antigo da cidade e fotografa prostitutas nas esquinas e uma foto da porta de um “motel”, toda pichada, com uma bicicleta e duas motos na calçada. Essas fotos foram estampadas no jornal com a seguinte legenda: “A exploração sexual de crianças e adolescentes pode ser vista por vários cantos”. Forçou demais a barra, embora possa ter levado a gozo um monte de leitores raivosos.
Em linha com essa reportagem, o apresentador de tevê Luciano Huck, conhecido por querer tirar vantagem de tudo, promoveu uma campanha para incentivar mulheres brasileiras a conseguirem gringos durante a copa. A ação consistia em criar as condições para que jovens cariocas mandassem mensagens com fotos de seus corpos para atrair “príncipes encantados gringos”. Com esse tipo de gente jogando contra, o Brasil entrou em campo com a bola do êxito na marca do pênalti. Felizmente quem estava no gol era a sabedoria de grande parte da população que não se deixa mais enganar pela ignorância massificada.