Desafios da Secultfor
Artigo publicado no Jornal Diário do Nordeste, Caderno3, pág.2
Quinta-feira, 27 de Dezembro de 2012 – Fortaleza, Ceará, Brasil
2012 termina com notícias animadoras na área da cultura em Fortaleza: a sinalização por parte do prefeito eleito Roberto Cláudio de que a cultura estará entre as prioridades da sua gestão (que começa na próxima semana) e o anúncio do nome do jornalista Magela Lima para ser o secretário da Secultfor. Essas duas boas novas criam a expectativa de que poderemos finalmente ter uma secretaria de cultura capaz de fazer jus ao tamanho, à importância e à complexidade da capital cearense.
Magela pensa bem, tem a cabeça arejada, visão abrangente e uma década de atuação no jornalismo cultural da cidade. Declarou que, ao ser convidado, recebeu do novo prefeito a orientação de integrar a parte da cidade que se encontra à margem do circuito cultural, e o encorajamento para pensar grande. Na entrevista que concedeu à jornalista Mayara de Araújo, deste Diário, deixou claro que está levando a sério a incumbência e que a Secultfor não abdicará de ter um projeto para a cultura: “A gestão anterior deixou a falsa ideia de participação” (DN, capa do Caderno 3, 21/12/2012).
Talvez por conta do que chamou de “falsa ideia de participação”, o novo secretário tenha que ser suficientemente claro, preciso e consistente ao expor os rumos que dará à política municipal de cultura. Os insumos para o seu projeto serão colhidos naturalmente nas propostas pactuadas para o segundo turno da campanha de Roberto Cláudio; documento cheio de janelas desafiadoras para a secretaria de cultura de um governo que almeja sintonia com a valorização do patrimônio simbólico na atualidade. O bom dessa base de compromissos é que suas diretrizes não estão engessadas, o que dá ao secretário a liberdade de traçar os caminhos pelos quais poderá oferecer a melhor contribuição da Secultfor aos objetivos da gestão.
Os desafios de Magela Lima passam por mudanças de posturas institucionais e operacionais, fundadas na ousadia concreta, no exercício honesto da capacidade criativa e na eficiência individual e coletiva, atribuindo à Secultfor um significado que lhe seja próprio e adequado às peculiaridades de Fortaleza no diálogo local e global. Se a intenção é trabalhar para chegar a uma cidade “boa de se morar e de ser feliz”, como está no plano do novo prefeito, e entrar no “calendário cultural nacional” (idem), precisamos de movimentações em linha com o que de melhor se faz no País, mas que também estejam aptas a produzir tendências.
Torço para que o Magela não se deixe tragar pela energia de varejo tradicionalmente instalada nos órgãos de cultura do executivo municipal. Como titular da Secultfor, é importante que ele encaminhe as pendências deixadas pela gestão que chega ao fim – a exemplo do vergonhoso atraso no pagamento de editais – mas que não aceite isso como vórtice sugador da sua energia. Talvez, para evitar tal contaminação, ele possa até criar um comitê específico para cuidar desses problemas, a fim de poder ficar livre para fazer o que precisa ser feito. Assim, o novo secretário e sua equipe poderão pôr em ação o que a realidade tem de potencial transformador e não de carências.
Fortaleza precisa ir além da superficialidade da cultura de massa e das manifestações ancoradas nos limites da subordinação a domínios numéricos. Precisa fugir do fatalismo da nossa ignorância, e isso não é uma questão de classe. Vivemos em uma cidade que não se conhece e, por conseguinte, não se reconhece, nem se faz respeitar. Ao propor uma política de cultura para a atuação da Secultfor, Magela Lima naturalmente abrirá um portal de busca para o desenvolvimento de um conceito sociocultural de cidade, dando vazão a encontros de olhares, revelações de impulsos sensíveis e organizações de contextos.
Em que pese os problemas resultantes das desigualdades, o fruir cultural da cidade depende da criação de uma ambiência propícia às expressões da liberdade de ânimo. A satisfação de ser de um lugar, de um nodo de onde parte a nossa voz, motiva os artistas, os escritores, os poetas, as cidadãs e os cidadãos a cantarem a cidade sem coação de curadorias e regulamentos. O êxito de uma secretaria municipal de cultura está na conquista de uma cidade livre para as representações de desprazer, de prestabilidade e de louvor à beleza, ao amor, à delicadeza, à atenção e à consideração ao seu estado de diversidade e pluralidade.
Tomando como referência o âmbito do executivo municipal, além das atribuições determinadas para a funcionalidade específica da sua estrutura, seria bom ver a Secultfor estabelecendo programas efetivos em interfaces com as demais secretarias da Prefeitura de Fortaleza. Neste campo há pelo menos três ramificações indispensáveis a essa cooperação: a primeira, que trata da qualidade do ser, a segunda, voltada para a socioeconomia criativa e, a terceira, concernente ao bem-estar coletivo.
Para tratar da qualidade do ser, da formação cidadã, a Secultfor pode estreitar a relação com a Educação (Ivo Gomes), sobretudo na questão da potencialização de leitores, com a secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente (Águeda Muniz), na reaproximação da cultura com a natureza, com a secretaria de Esporte e Lazer (Márcio Lopes), na intensificação do vínculo de saudabilidade dessa área com a arte, e na coordenadoria de Ciência, Tecnologia e Inovação (Tarcísio Pequeno) no que tange aos processos de criação tecnológicas e digitais.
Muitos dos programas voltados para a economia da cultura podem e devem muito bem ser desenvolvidos em comum com a secretaria do Turismo (Salmito Filho) e do Desenvolvimento Econômico (Robinson de Castro). Claro que envolvendo agências de fomento e desenvolvimento como o Banco do Nordeste, centros de apoio a empreendedores como o Sebrae, incubadoras de universidades, entidades sociais e educacionais do setor empresarial como Sesi e Senai, e organizações não governamentais que trabalham com economia solidária e comércio justo.
Na parte da cultura associada diretamente aos esforços pelo bem-estar coletivo, a Secretaria de Cultura pode ter programas compartilhados com a secretaria de Desenvolvimento Social, Trabalho e Combate à Fome (Cláudio Gomes), da Segurança Cidadã (Francisco José Veras), da Cidadania e Direitos Humanos (Karlo Cardoso) e com as coordenadorias da Juventude (Élcio Batista) e de Políticas sobre Drogas (Maria Juliana Sena). Sem contar com o fato positivo de a Prefeitura de Fortaleza ter em sua coordenação de comunicação o jornalista Moacir Maia, que é um respeitado animador cultural, e na liderança do prefeito na Câmara Municipal, o professor Evaldo Lima, que transita bem no esporte e na cultura.
Dando uma olhada nas propostas que serviram de plataforma para a eleição do prefeito Roberto Cláudio, só senti falta de um expresso compromisso dele com a “Cultura da Infância”. Acho até que, como ele está se dispondo a trabalhar para que Fortaleza seja uma cidade “criativa e inovadora” – o que não será possível com o encurtamento do músculo da imaginação das nossas crianças – tomo a liberdade de dizer que esse tema deveria ser ligado diretamente ao gabinete para poder funcionar, inclusive no âmbito das creches a serem implementadas pela prefeitura.
Dentre os compromissos do prefeito Roberto Cláudio com a sociedade fortalezense há uma rica oferta de possibilidades de ações culturais a serem trabalhadas pelo secretário Magela Lima, no sentido de criação de oportunidades de realização de espíritos criativos, de diálogos e trocas culturais e de mudanças de hábitos para o desenvolvimento social e econômico. Ele tem em mãos uma missão desafiadora e empolgante e preparo para dar conta do recado. Isso para mim soa como mensagem de Ano Novo. Então, Feliz 2013!!!