Na década de 1930, o governo estadunidense de Roosevelt (1882 – 1945) promoveu uma intervenção do Estado na economia do país (New Deal), que fora esfacelada por autofagia liberal. Outra medida oficial de enfrentamento da recessão naquele momento foi a entrada na Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945). É nesse cenário que o então jovem escritor Jack Kerouac (1922 – 1969) escreveu um romance (inacabado) no qual o protagonista Peter Martin é tentado a largar a faculdade para se alistar no Exército.
O livro A Vida Assombrada (L&PM, 2018) traz a parte ficcional, notas e trechos de cartas que permitem ao leitor deduzir como seriam os capítulos que o autor não escreveu. A obra revela os espantos da juventude em uma trama na qual Kerouac une simultaneamente as dúvidas naturais da passagem da adolescência para a vida adulta, a falta de perspectiva de trabalho e o choque com a iminência da guerra.
Logo no início, o pai de Peter resmunga que os EUA não são mais os mesmos, por estarem infestados por todo tipo de “raças imprestáveis”, referindo-se literalmente aos imigrantes judeus, gregos, africanos, armênios e sírios: “Você vai ver o dia em que um verdadeiro americano não terá mais chance de trabalhar e viver com decência em seu próprio país” (p. 38), adverte intolerante, transferindo aos não-brancos as causas do problema.
Para ele, “pessoas de bem” eram os ingleses, irlandeses, franco-canadenses e alemães. E afirmava taxativo o incômodo dessa gente por ter que se misturar com os “malditos chicanos”, que “dizem uma coisa e querem dizer outra” (p. 40). Ao mesmo tempo, o Sr. Martin amaldiçoa os britânicos: “A Inglaterra é uma valentona; o sol nunca se põe naquilo que ela roubou” (p. 101). Pressentia que, com o avanço da Alemanha sobre a Europa, certamente os ingleses convocariam o apoio norte-americano.
Como a maioria dos jovens, os personagens de A Vida Assombrada sonhavam em fazer o que queriam, mas estavam diante de uma conjuntura hostil. Enquanto escreviam poemas sobre a condição de garotos russos e alemães que morriam nas batalhas, receavam que a tragédia chegasse também a eles. No entanto, para quem tinha vontade de escrever roteiros e de atuar em Hollywood, mas sabia que não seria aceito por não ter ainda uma experiência marcante, o alistamento militar poderia significar viagens, mesmo que para zonas de combate.
No anseio pela aventura é que surge o desejo de largar os estudos para ir ser soldado. Os escritos de Jack Kerouac revelam mentes confusas, capazes de ler Fausto (Goethe), e sua venda da alma ao diabo, “com inveja no coração” (p. 94). Revelam também o fascínio que Peter tinha pelo amigo que “triunfara sobre o cinismo e o sentimento de desgraça” (p. 96), e que era o proponente da ideia do serviço militar. O que mais o perturbava era não saber como, sendo um sonhador, poderia matar pessoas.
A crise, o medo do fracasso e a indecisão sobre o que fazer da vida são pontos de realce nesse livro tão cheio de planos românticos em literatura realista. Peter Martin e seus amigos queriam viver livres do vazio e, como é comum aos jovens, não viam razão alguma para “admitir que o sucesso interior só pudesse ser conquistado às custas do sucesso exterior” (p. 95). Diante da institucionalização da barbárie, os personagens do iniciante Kerouac procuram despistar as circunstâncias.
Na década de 1930, o governo estadunidense de Roosevelt (1882 – 1945) promoveu uma intervenção do Estado na economia do país (New Deal), que fora esfacelada por autofagia liberal. Outra medida oficial de enfrentamento da recessão naquele momento foi a entrada na Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945). É nesse cenário que o então jovem escritor Jack Kerouac (1922 – 1969) escreveu um romance (inacabado) no qual o protagonista Peter Martin é tentado a largar a faculdade para se alistar no Exército.
O livro A Vida Assombrada (L&PM, 2018) traz a parte ficcional, notas e trechos de cartas que permitem ao leitor deduzir como seriam os capítulos que o autor não escreveu. A obra revela os espantos da juventude em uma trama na qual Kerouac une simultaneamente as dúvidas naturais da passagem da adolescência para a vida adulta, a falta de perspectiva de trabalho e o choque com a iminência da guerra.
Logo no início, o pai de Peter resmunga que os EUA não são mais os mesmos, por estarem infestados por todo tipo de “raças imprestáveis”, referindo-se literalmente aos imigrantes judeus, gregos, africanos, armênios e sírios: “Você vai ver o dia em que um verdadeiro americano não terá mais chance de trabalhar e viver com decência em seu próprio país” (p. 38), adverte intolerante, transferindo aos não-brancos as causas do problema.
Para ele, “pessoas de bem” eram os ingleses, irlandeses, franco-canadenses e alemães. E afirmava taxativo o incômodo dessa gente por ter que se misturar com os “malditos chicanos”, que “dizem uma coisa e querem dizer outra” (p. 40). Ao mesmo tempo, o Sr. Martin amaldiçoa os britânicos: “A Inglaterra é uma valentona; o sol nunca se põe naquilo que ela roubou” (p. 101). Pressentia que, com o avanço da Alemanha sobre a Europa, certamente os ingleses convocariam o apoio norte-americano.
Como a maioria dos jovens, os personagens de A Vida Assombrada sonhavam em fazer o que queriam, mas estavam diante de uma conjuntura hostil. Enquanto escreviam poemas sobre a condição de garotos russos e alemães que morriam nas batalhas, receavam que a tragédia chegasse também a eles. No entanto, para quem tinha vontade de escrever roteiros e de atuar em Hollywood, mas sabia que não seria aceito por não ter ainda uma experiência marcante, o alistamento militar poderia significar viagens, mesmo que para zonas de combate.
No anseio pela aventura é que surge o desejo de largar os estudos para ir ser soldado. Os escritos de Jack Kerouac revelam mentes confusas, capazes de ler Fausto (Goethe), e sua venda da alma ao diabo, “com inveja no coração” (p. 94). Revelam também o fascínio que Peter tinha pelo amigo que “triunfara sobre o cinismo e o sentimento de desgraça” (p. 96), e que era o proponente da ideia do serviço militar. O que mais o perturbava era não saber como, sendo um sonhador, poderia matar pessoas.
A crise, o medo do fracasso e a indecisão sobre o que fazer da vida são pontos de realce nesse livro tão cheio de planos românticos em literatura realista. Peter Martin e seus amigos queriam viver livres do vazio e, como é comum aos jovens, não viam razão alguma para “admitir que o sucesso interior só pudesse ser conquistado às custas do sucesso exterior” (p. 95). Diante da institucionalização da barbárie, os personagens do iniciante Kerouac procuram despistar as circunstâncias.