Embora a palavra indústria seja um substantivo feminino, o mundo das fábricas sempre foi campo de domínio masculino; o adjetivo ‘industrial’, comum de dois gêneros, praticamente ainda parece associado a homens. Entretanto, as mulheres estão nas fábricas desde o início da Revolução Industrial, no século 18. Tem-se aí um longo tempo de lutas, rompendo travas comportamentais e de preconceitos para o reconhecimento da importância da participação feminina nesse setor da economia.

O índice da participação de mulheres gestoras na composição de cargos da indústria brasileira é de 31,8% (CNI, 2023). Ainda é um percentual muito baixo, mas são avanços que precisam ser comemorados. Isso sem contar com tantas e tantas mulheres que contribuem para a movimentação das cadeias produtivas, comandando empresas de diversos portes que são fornecedoras da indústria, e, também, sem esquecer todo o ecossistema da geração de renda e consumo por meio da economia informal.

Com o intuito de fortalecer o processo de sedimentação da atuação feminina no ethos industrial, a Editora Leader está lançando o primeiro volume da série “Mulheres na Indústria” (São Paulo, 2024), com textos autobiográficos enfocando bastidores da relação entre carreira e vida pessoal. Essa iniciativa é muito oportuna, em um tempo de grandes avanços tecnológicos nos ambientes corporativos, onde as antigas demandas por força humana estão cada vez mais sendo substituídas por exigências de habilidades criativas, conhecimentos, inovações e competências diferenciadas.

Para mostrar que a proposta é para valer, o livro traz relatos da própria editora e das organizadoras. Sonhos e realidades práticas são compartilhados por executivas vitoriosas, a partir da infância e das relações familiares de cada uma até suas conquistas do equilíbrio entre viver e trabalhar, passando pelos caminhos de formação profissional e por lembranças de importunações e acolhimentos no cotidiano empresarial.

“A mulher no trabalho” (1943), obra da pintora inglesa Laura Knight (1877 – 1970).

Andréia Roma, CEO da Leader, conta que aprendeu com o pai nordestino e com a mãe paulista que, aconteça o que acontecer, é preciso amar, sempre. Conta que em sua carreira de sucesso nunca esqueceu de colocar na agenda o tópico “Tempo para Amar”. Por onde passou, procurou testar os valores da sororidade recebidos em casa para a criação de vínculos significativos com a irmã. Isso está na base do conceito dos projetos editoriais que realiza com mulheres, nos quais abre espaços para que cada autora fale de suas origens, como forma de perceber o quanto evoluíram e de modo que possam servir de referência para outras mulheres.

A organizadora Cristiane Crucelli revela sofrimentos de bullying e xingamentos em reuniões de gestão em algumas empresas por onde passou, mas seguiu em frente, movida pela crença de que a mulher também ‘pertence’ ao mundo industrial. A outra organizadora da coletânea, Érica Navarro Costa, diz que viver é muito mais do que trabalhar, “A vida é uma coisa só”, e que se deu conta disso quando conseguiu conciliar o trabalho e o cuidado com os filhos e legar sua experiência para a melhoria da vida das pessoas com as quais trabalha, abraçada à máxima de que vale a pena ser a mudança que se quer ver no mundo.

Autora convidada, Andréia Fukuda reflete como construiu suas conquistas tendo como ingredientes um mix de “destino, coincidências, escolhas, estudo e trabalho árduo”. Como essas, outras histórias curiosas permeiam a coletânea da Leader, que tem mulher ‘competitiva por natureza’, que nunca sentiu vontade de ser mãe, e mulher que, por conta de ter recusado propostas absurdas ao retornar da licença-maternidade, acabou sendo promovida por ter tido essa atitude. São histórias que realmente precisam ser contadas.

Fonte:
Jornal O POVO