O lugar da educação
Artigo publicado no Jornal O POVO, Caderno Vida & Arte, pág.4
Quarta-feira, 18 de maio de 2016 – Fortaleza, Ceará, Brasil

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FAC-SÍMILE

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Conheci uma escola em que as salas de aula espalham-se pelas áreas de recreação, biblioteca, recepção, enfermaria e administração, estendendo-se pela cozinha e alcançando literalmente distantes territórios de aprendizagem. O CEB (Centro Educacional Brandão) fica em Moema, São Paulo, tem estrutura e administração familiar, com mais de quatro décadas educando e formando gente para melhorar o mundo. É uma escola de período integral, com funcionamento do berçário ao nono ano. Mesmo assim, vi por lá um grupo do Ensino Médio que se encontrava para almoçar no refeitório da escola, para matar a saudade.

Estive há um mês no CEB e eles estavam se preparando para mais uma viagem pedagógica, desta vez com estudantes do oitavo ano. O destino: Nova Olinda, interior do Ceará. Fiquei interessado em saber as razões da escolha de uma pequena cidade do Cariri como destino de aprendizagem para uma escola paulistana. Foi então que passei a conhecer detalhes do projeto e dos níveis evolutivos dos degraus de viagens do CEB, que começam com quatro dias de duração para crianças de dois anos, passam a cinco dias para as crianças de oito a onze anos, seis dias para as de doze e treze anos e de sete dias para as de catorze anos.

A sequência dessa prática levou a escola – fundada em 1972 pela professora Maria de Nazaré Brandão – a fazer de cada viagem, longe da família e do ambiente escolar, mais uma oportunidade especial, de exercício da autonomia com responsabilidade. Assim, as crianças de dois anos de idade são, por exemplo, orientadas a arrumarem a própria cama, a fazer parte da higiene pessoal e a escolher a roupa adequada para a programação do dia.

O Coordenador de Viagens, Walter Fonseca, conta que o patamar de desafios vai sendo elevado, uma vez que os projetos são pensados sempre a partir da observação e reflexão sobre a vivência dos alunos. Lembra também que há doze anos era comum crianças do quinto ano procurarem a companhia de professores na hora de dormir nas viagens feitas à Ilha Grande e que, hoje, nessas viagens, a meninada dessa faixa etária prefere dormir, em duplas, em barracas a ocupar os apartamentos disponíveis na pousada.

Quanto aos dois grupos de oitavo ano que viajaram separadamente para Nova Olinda na primeira e na segunda semana deste mês de maio, a experiência foi tão consistente e intensa que a escola já decidiu incluir Nova Olinda em seu calendário de atividades. A Diretora Pedagógica, Marta Brandão, explica que, além de participarem das tarefas do dia a dia da Fundação Casa Grande, juntamente com meninas e meninos que são exemplos de autonomia com responsabilidade, os estudantes do CEB tiveram a oportunidade de ficar em pousadas domiciliares e de conviver com “pessoas que vivem a vida numa outra cadência, em que o tempo e a dedicação ao outro consideram sempre o bem-estar de todos”.

A aproximação do CEB com a Fundação Casa Grande se deu a partir de uma entrevista do Alemberg Quindins em um programa de televisão há cerca de cinco anos, no qual o criador dessa espetacular experiência de educação sociocultural comunitária se mostrava como alguém que, segundo Marta, “se permite sonhar com o que há de melhor no desenvolvimento do ser humano e colocar em prática suas ideias através de uma interpretação única”. Para ela, tudo isto era muito importante de ser vivenciado de perto pelos alunos do CEB. E deu certo: a escola estava no lugar da educação.