Em outubro, muitas comemorações são feitas em nome da criança e outras tantas com a criança. Entre as que valorizam o gosto pelo brincar, sem psicologização da brincadeira e fora das padronizações da infância-produto, está a Festa do Saci, uma manifestação socioantropológica brasileira, inspirada nos dons, nos sentidos e na imaginação.

Nas sacizadas, meninas e meninos dão pulos e assobios em uma poética intuitiva e sensorial do corpo, da mente e do espírito infantil em sua mais largada liberdade. E tem função do Pererê este ano, no domingo dia 20, às 10 horas, com o grupo Dona Zefinha, na Ilha Maravilha, um especial recanto do brincar, que fica na Lagoa Redonda, em Fortaleza.

Ilha Maravilha é como a bióloga Marisol Albano passou a chamar o quintal da casa do seu pai, o sempre amado fotógrafo de natureza Maurício Albano (1945 – 2015), e onde realiza atividades arte-educativas infantis e de diversão cogeracional, a exemplo da Festa de Ventos e Cajus, no início da temporada dos ventos.

Redemoinhos cheios de sacis são comuns nessa época do ano pelas plagas cearenses. Os ventos contrários que se encontram em rodopios convidam os adultos a levarem as crianças que amam para juntarem suas informações lúdicas preexistentes com brinquedos que brincam e brincadeiras auto-ativas, nascidas na vivência com um ser fantástico cheio de travessuras e afetividade em sua bagagem de códigos culturais.

O Saci vem de dentro e, ao mesmo tempo, vem de fora de quem brinca, por ser uma possibilidade que se exerce por si mesma, em evidência solta do prazer de estar descalço, de meter o pé na terra, de subir em árvores e pegar nas folhas esvoaçantes. Sacizada não é folclore, mas interação e integração do mito com a realidade da criança em sua plenitude.

Nessa festa de contato com a natureza, o livre-brincar abre-se às multiplicidades de tudo o que vive. Dos caminhos culturais que passam pelo imaginário, como a arte e a espiritualidade, a sacizada proporciona experiências de socialização com igualdade na riqueza de ser criança, por ter em sua afável complexidade existencial uma narrativa comum de sensações, pensamentos e invencionices.

Por ser uma expressão da natureza e uma criação da cultura, o Saci está na predisposição subjetiva de crianças e adultos como algo supra individual, condição que facilita entrelaçamentos e trocas interativas. O gesto-prazer, em uso livre da vontade, sugere na Festa do Saci variadas maneiras de vinculação da fantasia com o contexto social, e da fantasia com ela mesma.

A sacizada é um campo de sentido formado por essencialidades culturais, por combinações simbólicas e por reciprocidades imaginativas, no qual a criança pode fazer recriações e inventar novos mundos por meio de um ritual de inversão onde predominam a alegria, o humor e a danação. Não é nada, além de tudo, enquanto alternativa que parte da imaginação e não do concreto.

Cada Festa do Saci é uma festa única. Não dá para dizer como será a da Ilha Maravilha. Isso é surpresa. A estrutura do espaço é bem convidativa para a agitação da meninada e canalização dos seus gritos de iuhuu!, com chuva de gorros mágicos e polinização de flores da amizade. As crianças amam as sacizadas porque brincar com o Pererê é um jeito animado de escutar a natureza, a cultura e a própria infância.