Todos os sábados pela manhã acontece uma feirinha de produtos orgânicos e agroecológicos na área Adahil Barreto do Parque do Cocó. Agricultoras e agricultores de municípios serranos e da Região Metropolitana de Fortaleza, articulados na Rede EcoCeará, expõem os produtos da própria lavra familiar, naquele arborizado recanto urbano, onde pessoas fazem piquenique, caminham e flanam.
Estive sábado passado experienciando esse contato direto e ao ar livre de quem consome com quem produz. De barraca em barraca fui percebendo a satisfação que há nas pessoas que vendem o que plantam e colhem, lastreadas por certificações confiáveis. E tudo espalhado em ar de contentamento biocultural, como se houvesse uma sintonia alegre de gente, fruta, verdura e seus derivados.
Tem aumentado o número desse tipo de feirinha em Fortaleza, o que demonstra a existência, mesmo que incipiente, de uma busca de atenção mútua entre a agricultura familiar organizada e a vida urbana que vem despertando para alimentos mais saudáveis, com maior teor de vitaminas e minerais, para as questões climáticas e para o respeito ao planeta.
Os produtos orgânicos, por serem da natureza como ela é em seus sabores, cores e formas, e cultivados em pequenas propriedades familiares, não têm a maquilagem nem a padronização de muitos produtos que parecem de plástico; em compensação, não têm também agrotóxicos, adubos químicos e fertilizantes sintéticos, que fazem mal à saúde e provocam alto impacto ambiental.
A agricultura orgânica e agroecológica constitui-se em um elo imprescindível ao reequilíbrio da cidade com o campo. A economia urbana, em sua vontade especulativa incontrolável, pode até dispensar o contato com a natureza, e, em sua pressa esquizofrênica, priorizar alimentos processados, mas essa realidade está mudando. E um sinal disso é o aumento da demanda por produtos naturais.
Outro aspecto merecedor de realce na presença dessas feirinhas que acontecem à margem do sistema gerador de concentração, são os traçados que elas vão imprimindo nas relações de trabalho e renda em que se apoiam as trabalhadoras e os trabalhadores que constroem esse tipo de vida em emancipação. A integração com o mundo urbano é fundamental para desfazer o paradoxo da abundância concentrada e da escassez socializada do modelo dominante.
Antes da consciência dos direitos civis e políticos, a cidadania nasce pela boca; e nasce no campo. Com fome e malnutrida, uma sociedade não tem como pensar em civilidade. O acesso à alimentação é um direito social, como moradia, saúde, educação, locomoção, liberdade de expressão e deliberação de cada pessoa sobre sua vida. O direito de viver começa no direito de comer. Por isso, a agricultura familiar é indispensável à cidadania.
O abastecimento saudável feito por quem produz, sem intermediários e à base de energia solar, está na linha de frente das soluções dos nossos problemas econômicos e sociais. A múltipla produção em geografias distintas e em pequena escala é cada vez mais essencial nos tempos atuais. Somente assim haverá a revitalização das feiras locais, as trocas entre comunidades e municípios vizinhos, o aumento do fornecimento para a alimentação escolar e, claro, o atendimento ao consumo saudável nos grandes centros urbanos.
Enquanto escolhia o que levar para casa, comecei a pensar em tudo isso. Saí dali ampliando a reflexão sobre o quanto é óbvio, mas ao mesmo tempo tão difícil, priorizar uma economia que racionaliza o uso dos recursos naturais e que contribui para situações sociais mais justas, produzindo alimentos saudáveis, saborosos e nutritivos.