O litoral Oeste do Ceará tem cantos e encantos inesquecíveis. Um desses lugares deslumbrantes é Torrões, a 220km de Fortaleza pela rota do sol poente. Com vasta faixa desértica de areia branca, mar de relaxante energia luminosa, ondas leves, águas rasas e quentes, trechos de areia preta batida, maceiós e coqueirais, abriga também a foz do rio Aracatimirim, com seu porto de barcos lagosteiros.
Descobri as belezas de Torrões quando, juntamente com o jornalista Miguel Macêdo, preparamos a edição de 1997 do Guia de Praias Ceará, publicado pela Fundação Demócrito Rocha. Depois passamos por lá mais algumas vezes, de buggy, helicóptero, caminhonete 4 x 4 e automóvel 1.0, quando fazíamos as atualizações de todo o litoral cearense para mais duas edições publicadas em 1999 e 2003.
Estive na região em outras ocasiões, conversando com professoras e professores sobre o meu trabalho de literatura e música infantil, normalmente em viagens com a Andréa e com os nossos filhos, Lucas e Artur, mas não havia retornado a Torrões. Com a recente inauguração da aconchegante pousada Kiriri, cujo nome indígena quer dizer ‘sossego’, fomos usufruir das graças daquela praia itaremense.
O complexo de prazeres de Torrões é ideal para quem quer ficar sem fazer nada diante da imensidão enquanto substantivo feminino. A sensação de paz, de segurança e de singeleza natural nos acompanha no caminhar descalço pela praia de braços com o vento e dirigindo à toa pelos mangues e coqueirais das redondezas.
Tudo vai se revelando nas redes de dormir armadas sob pequenas sombras nos povoados ensolarados e nas entradas de acesso para encontros com as águas, as velas, os barcos e o horizonte, onde são jogadas as redes de pesca e os manzuás. O espírito Tremembé de ‘peixes racionais’ está presente na região.
A culinária à base de pescados e frutos do mar é também um ponto de sabor naquelas paragens. Restaurantes como o Do Mar, na Ilha de Guajiru, temperam o passeio com pratos e drinks deliciosos, além de oferecerem vista para a grande lagoa formada pelo avanço do mar entre a península (e não uma ilha) e o mangue, local preferido pelos praticantes de kitesurf.
Cada parada realça os traços do lugar: pesca, gastronomia e artesanato. No Porto dos Barcos, quando a maré está baixa, é incrível o cenário com tantas embarcações descansando na proteção de suas âncoras; na Ilha de Guajiru (antes conhecida como Guajiru de Itarema), os destaques ficam com as pousadas e restaurantes; e a arte da renda espalha-se pelos povoados de Farol de Itapajé, Volta do Rio, Ostra e Espraiado.
Visitar a igrejinha de Almofala, de estilo setecentista moçárabe, que passou 45 anos coberta por uma duna andante, é sempre inquietante. Aquele lugar inspira muitas indagações a respeito dos aldeamentos jesuítas, da vontade de permanência da gente nativa, da dança do Torém, das cuias de mocororó de caju e da Escola Indígena Maria Venância, onde jovens Tremembé mantêm seus vínculos étnicos e culturais.
Os carcinicultores nomearam de Costa Negra a área que fica entre os rios Aracatimirim e Acaraú, como marketing para a exportação de camarão de cativeiro. Economicamente, essa região tem crescido bastante, mas apresenta um preocupante descompasso entre evolução de negócios, oportunidades sociais e cuidados com o meio ambiente. Basta citar que a base do projeto Tamar de Itarema está fechada. Por que é tão difícil pensar no desenvolvimento com equilíbrio?