Augusto Rocha nasceu em Oeiras, no Piauí, e há anos vive em Fortaleza. Apaixonado por viagens de motocicleta, já escreveu vários livros com suas aventuras sobre duas rodas. Nestes tempos de pandemia de Covid se apeou com cautela, mas nem por isso ficou quieto; tanto que está publicando o livro “Zonda” (SG, 2021), sobre a última motoviagem que fez com os amigos Verô, Sáris e Lourinho no final de 2019 pelo sul do Continente.
Zonda é o nome que se dá à ventania forte e intensa que descamba da Cordilheira dos Andes, forçando o piloto a provar sua disposição diante do risco. O motociclista precisa aprender a respeitar as vontades dessa corrente de ar para poder desfrutar da sensação de liberdade que ela oferece a quem deseja transitar por dentro daquela beleza em estado de imensidão.
Acostumado ao vento morno e às vezes fresco que perambula pelas ruas oeirenses perpassando o espírito animado das conversas de calçadas; ao vento que balança as palmas de buritis do Meio Norte; e às ventanias cearenses do segundo semestre, com suas rajadas litorâneas, Augusto transformou em crônica cada respiro dessa jornada. O livro está disponível em versão impressa e e-book no varejo digital.
A mania de pegar a estrada é espirituosamente tipificada por ele como um vírus para o qual não há vacina, o “Viajanttis invetteradus”. Como não tem cura mesmo, e contrariando o sentido de “outrossim”, ele transforma os dias de férias do trabalho burocrático como fazendário no ofício de viajar. E já cascavilhou o Brasil e a América do Sul de uma ponta à outra da rosa dos ventos. Sem contar que andou de motocicleta pelo norte da Noruega.
Nas 19 crônicas de “Zonda”, Augusto Rocha registra detalhes sobre a motivação da viagem, como o grupo dos quatro amigos se formou, a definição da rota, os preparativos, os cuidados com a máquina e com o corpo, as incertezas, a relação com o vento e a viagem em si. Fala também de encontros, como o que teve com um simpático senhor cafeteiro, para quem tocou “Das terras do benvirá” (Geraldo Vandré) ao violão e só depois descobriu que o sujeito tinha sido soldado da sangrenta ditadura do general Pinochet.
A essa motoviagem não faltou o capricho da marcação do território visitado. No adesivo-tema de “Zonda”, está escrito: “De farol em farol”, com os nomes dos quatro amigos nas extremidades. A expressão quer dizer que a partida se deu no farol alvinegro do Mucuripe, nas dunas de Fortaleza, tendo como destino final o farol vermelho e branco Les Eclaileurs, localizado em uma ilha da entrada marítima de Ushuaia.
É comum também que, mesmo em grupo, o motoviajante tenha o seu adesivo individual. O de Augusto Rocha nessa viagem foi uma carta de baralho estilizada, com um motociclista no lugar da figura do valete e as iniciais “A” e “R” no lugar do “J”, de jack, que quer dizer valete nas cartas inglesas. Esses adesivos são fixados em vidraças de restaurantes, hotéis e em lojas de conveniência dos postos de abastecimento.
As crônicas são pontuadas por um discurso palavroso nordestino. Para falar de um dia chuvoso, com frio e muito vento, o autor escreve: “O tempo havia entristecido” (p.111). Têm isso também nas passagens em que Augusto Rocha toma referências regionais para suas apreciações, como na estranha sensação que sente ao perceber que o zurro dos pinguins é muito semelhante ao dos jumentos (p.80). E jumento é bicho que assusta motociclista nas estradas.