De agosto para setembro os ventos vão tomando conta do Ceará. A região litorânea do Estado ganha nesse período o florescimento da safra de caju, que se estende até novembro. Esse fenômeno de frescura e de fartura é comemorado pelas crianças e suas famílias em um quintal arborizado na Lagoa Redonda, chamado de Ilha Maravilha.
Manhã de sábado, estive lá. Ouvi o rói-rói anunciando que a alegria tinha chegado. A água do balde não me deixa mentir, estava ali ensopando bolo de terra, refrescando a diversão no sombreado do cajueiral. Os panos voavam, os galhos das plantas dançavam e os grãos de areia rodopiavam em apelo à curiosidade, à diversão frouxa.
Meninas e meninos circulavam com o vento e o vento tinha a espontaneidade da infância. A brincadeira fruía doce como caju e livre como cores de flores a balançar. Festa co-geracional, adultos e crianças na conjugação do movimento do vento e cheiro de castanha assada no fogo dançarino.
Nada de competição, apenas impulsos inventivos, vida experimental, pernas de pau tocando a terra, pés descalços sobre a imagem das folhas e dos galhos desenhados no chão em sinal de folia. Meninas e meninos metiam-se no caminho umas das outras, entre bolhas de sabão gigantes a espelhar o sopro do menino sem camisa e a respiração agitada da menina de cabelos esvoaçantes.
O tempo, a energia, bonecas e carrinhos vivendo a existência da fantasia que vira ação, que corre, que para e balança na rede de punhos sustentados em gesto galante dos troncos das árvores. E as palhas dos coqueiros dizem amém, reverenciando a brincadeira e dando longa vida aos ventos em irmandade com os cajueiros. Êêêevento bom, clama a Marisol Albano, a bióloga-educadora da rua das Laranjeiras: “E é caju de ruma! Quando juntos nossa forma se apruma”.
É hora de quebrar castanha, de requebrar, de comer o fruto do caju e depois beber o suco travoso, gostoso, ferroso, delícia de fibra que vibra, que bate braços no pula-pula e pernas na ponte de cordas em vaivém de gritaria. Tudo o que a meninada gosta quando cava o chão e escala árvores rumo ao céu azul. E azul era a camisa do compositor Calé Alencar, com a foto do Cego Aderaldo estampada no peito.
Isso porque a festa era também de comemoração de 40 anos da canção Vento Rei (Calé / Zé Maia): “Fiz no dorso do vento meu cavalo / Nas brancas crinas, paixão criei / E amei no dorso do vento rei / No voo me aventurei / Cavaleiro do ar (…) Na paz que há no rosto dos meninos”. Voz e violão do autor, na brisa risonha da Pifarada Urbana e ao sopro de animados tambores.
Na Festa de Ventos e Cajus da Ilha Maravilha, os cata-ventos enlouquecem de felicidade com as carícias do ar, do verbo amar e do cirandar de fitas coloridas soltas como a imaginação. Iuhuu!!!