Ana Flávia Marques
Especial para O Povo
Ana.flavia@opovo.com.br
“O ar acabou pra mim em Wuhan / Acabou em Nova Iorque / Já não respiro nas ruas de São Paulo / Falta ar no cruzamento das fronteiras / Desse tempo calculado em adeus”. Os versos pertencem à canção “Asfixia”, de Flávio Paiva e Laura Finocchiaro, e refletem sobre um tempo de sufocação, medo e incertezas: a pandemia da Covid-19. Foi dessa insegurança que Flávio Paiva partiu para traçar a história do seu novo conto, “Asfixia”, onde dois personagens idosos lutam por humanização em tempos de despedidas. O livro será lançado no sábado, às 17 horas, na Casa Bendita.
A obra surgiu a partir da tensão causada pelo aumento do número de mortes em decorrência da Covid-19, ainda no início da pandemia. “São dois personagens que não se conhecem, mas diante da grande ameaça da chegada da pandemia, onde as pessoas com idade avançada foram apontadas como um dos principais alvos, cada um, à sua maneira, começou a desenvolver estratégias de como conviver com isso”, explica o também colunista do Vida&Arte.
O autor relembra o começo de tudo: desde a falta de informação até a tristeza de quem não pôde enterrar os próprios parentes. Em meio ao caos, Flávio encontrou uma válvula de escape na escrita: “Quando não tínhamos a clareza do que estava realmente acontecendo, a literatura foi o respiro; é uma forma de se testar hipóteses, observar por olhos imaginários”, reflete.
Em referência ao título, Flávio explica que a sufocação metafórica se dá por diversas vertentes ao longo da narrativa: pelo isolamento social, quando os personagens precisam ficar dentro de casam, e pelas suspeitas das outras pessoas, quando qualquer um pode estar contaminado.
Além do conto, veio a canção “Asfixia”. Essa mescla de literatura e música já é característica dos trabalhos do Flávio, que tem em seu currículo diversos livros, álbuns e singles. “No meio do trabalho de escrever o texto, surgiu a música. Eu parei e já fui fazer a composição em parceira com a Laura Finocchiaro, e depois voltei para concluir o texto, já com a música pronta”, relata. “Essas expansões da arte e da literatura foram formas de cura em um momento que as questões sanitárias estavam totalmente em desmoronamento”, acredita.
A canção faz parte da narrativa e nasce a partir das dores emocionais de um dos personagens. “Em um momento de alucinação é comum diante do temor você ter discursos internos na cabeça, martelando coisas, falando alto, por isso essa música é um extravasamento da dor”, explica. Trazendo mais contradições, a canção é uma balada punk, dançante, que reflete a catarse vivida pelo personagem.
Com apenas 500 exemplares, que não irão às livrarias, pois estarão disponíveis somente no evento, o autor considera um ato estético que simboliza o recomeço da convivência em espaços sociais e culturais. “No fundo, ele não é só um livro. É um conjunto de coisas. É livro, música, mas, acima de tudo, é um instrumento de ato simbólico do reencontro”, reflete.
Flávio relembra que há outros elementos sufocantes, que existem desde antes da pandemia, como violência, mudanças climáticas e conflitos políticos deformados. “Espero que esse grande drama da pandemia tenha produzido reflexões de que somos muito mais frágeis do que imaginamos, e que a natureza não depende da experiência humana para existir; que, com essa grande tragédia mundial tenhamos aprendido pelo menos isso”, finaliza.
Lançamento do livro “Asfixia”, de Flávio Paiva
Quando: sábado, 27, às 17 horas
Onde: Sala de eventos da Casa Bendita, no andar superior (av. Rui Barbosa, 888)
Mais infos: Casa Bendita ou (85) 3093-7717
Obrigatório uso de máscara e apresentação de comprovante de vacinação.