Jornal O Povo, 31/10/2007

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Flávio Paiva, jornalista e escritor lança hoje livro infantil A Festa do Saci (Foto: Divulgação)

Flávio Paiva jura de pés juntos: “A história deste livro é uma história real”. Gnomos e duendes foram aprisionados dentro de uma velha máquina de escrever de uma tia de Flávio. Quando a tia, já idosa, decidiu partir em viagem às cidades do interior de Minas Gerais, ele herdou a máquina. Os seres fantásticos pularam quando Flávio começou a bater nas teclas. “Eu tive apenas o trabalho de arrumar o que eles estavam fazendo”. A história deu no livro A festa do Saci que será lançado hoje como parte da programação do Dia do Saci da Secult. 

O livro infantil conta a história de uma batalha entre seres mágicos que buscam a ajuda do “mais brincalhão dos seres fantásticos brasileiros” para que ele lidere a luta contra o avanço da Mente Rosa, “um monstro pink-sujo que está transformando as crianças em pequenos seres vazios”. O Saci, ser inquieto e travesso, seria o mais indicado para combater a padronização orquestrada pela Mente Rosa. 
A narrativa da batalha, com contornos bem definidos entre bem e mal, é uma metáfora para as intrincadas disputas pela hegemonia cultural em tempos de globalização. O avanço das comemorações do Halloween pelo Brasil provocou reações. Entre elas, a mais significativa é a instituição em algumas cidades do país – entre elas a megalópole São Paulo – do dia 31 de outubro como Dia do Saci, uma forma de se contrapor ao “dia das bruxas” estadunidense que vem sendo cada vez mais replicado por aqui. A iniciativa que partiu da Sociedade dos Observadores de Saci (ver coordenada) ganha força e já possui dois projetos de lei federal tramitando no Congresso para oficializar nacionalmente o dia, além de um processo no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para o reconhecimento do Saci como patrimônio imaterial nacional. 
“As festas das bruxas norte-americana é a segunda maior festa de consumo dos Estados Unidos. Depois do Natal, ela é a maior. Esse negócio tá crescendo aqui no Brasil de uma maneira assustadora. Ela é uma festa de padronização”, diz Flávio Paiva. Para o autor, “os sacis são um bom símbolo anti-consumista, porque são muitos e eles podem se associar ao mito local. Essa diversidade da criação da mente imaginativa do Brasil mestiço possibilita que a festa dos sacis nos diversos lugares do Brasil sejam festas diferentes”, conclui. 
Mito mais difundido pelo Brasil, o Saci teve origem entre os tupi-guarani com o papel de guardião das matas . Ao longo de seus dois séculos de existência ganhou dos negros a cor, o cachimbo e os movimento ágeis da capoeira; e dos europeus, vestiu o capuz vermelho, trazidos pelos imigrantes, emblema da liberdade na Roma antiga e adotado pelos republicanos após a Revolução Francesa. Esses aspectos fazem do Saci o mito escolhido para essa disputa simbólica. “Um dos motivos é essa coisa da natureza, o mito ecológico. Ele dá vida e expressão às áreas verdes. Outro aspecto muito importante é o da brasilidade. Os lugares do mundo que não tiverem a força de sua cultura virarão mão de obra barata pra fazer os mais diversos produtos em situação de semi-escravidão ou terão a existência percebida apenas pelo poder de consumo”, interpreta Flávio. 
A Secretaria de Cultura (Secult), a partir deste ano, integra o Dia do Saci no calendário cultural do estado. Pela manhã e tarde, na Biblioteca Pública Menezes Pimentel a programação acontece com alunos de escolas púlicas com contação de histórias, ciranda com os idosos, distribuição de gorros para as crianças, entre outras atividades culturais. À noite, continua com atividades adultas no Centro Dragão do Mar, a partir das 19h. Além do lançamento do livro e CD A Festa do Saci, será exibido o documentário Somos Todos Sacys. Para finalizar a programação, a mesa redonda Saci X Halloween: A Guerra dos Mitos, com mediação do jornalista Flávio Paiva e participação do secretário da Cultura do Estado, Auto Filho, do jornalista Antônio Vicelmo, da professora Fátima Limaverde e do vereador Guilherme Sampaio. 
“O interesse nosso é mais o de dizer que o Saci existe. O Halloween pode existir, mas a gente quer dizer que o Saci existe também”, diz Otávio Menezes, técnico do setor de patrimônio imaterial da Secult. O propósito, segundo Flávio Paiva, é voltar a enxergar o Saci em uma dimensão atual e não preso aos compêndios folclóricos. “Folclore é uma espécie de garrafa que aprisiona o Saci. O propósito da gente tentar enxergar o Saci é restabelecer o espaço de vida da natureza que existe na zona urbana”. 

SERVIÇO 

Lançamento do livro A festa do Saci do autor Flávio Paiva , hoje, às 19h, no Auditório do Centro Dragão do Mar (Rua Dragão do Mar, 81 – Praia de Iracema). O livro acompanha um CD e será vendido por R$ 34,90. O lançamento faz parte da programação do Dia do Saci da Secult. Info.: (85) 3101.1191 

Conteúdo extra 
Ouça trechos do CD que acompanha o livro no site www.opovo.com.br\conteúdoextra